Em 1936, na exposição Cerâmica Olisiponense, realizada pela Câmara Municipal de Lisboa, uma extensa galeria de retratos régios em azulejos foi aplicada nos muros do jardim do Palácio das Galveias, em Lisboa.
O restauro dos painéis de azulejos, executado pela Fábrica de Cerâmica Constância – na época de transição entre a direção de Leopoldo Battistini (1865-1936) e a de sua discípula Maria de Portugal (1884-1971) –, implicou a pintura dos retratos em falta, do período que abrange os reinados de D. João II até D. Afonso VI.
Sem que se conheça a proveniência do conjunto, a galeria reúne retratos régios de duas encomendas distintas com uma década de diferença, e as representações do conde D. Henrique e da princesa D. Carlota Joaquina, realizadas para o patamar de uma escada, exibem molduras diferentes das dos restantes monarcas. No caso da princesa espanhola, Paula e Oliveira seguiu com rigor a gravura de Manuel Marques de Aguilar (1767-1816), que por sua vez reproduz um retrato do pintor régio Giuseppe Troni (1739-1810).

Ambas as encomendas podem ser atribuídas a Francisco de Paula e Oliveira (act.1788-1825), oleiro, pintor de azulejos e mestre da Real Fábrica de Louça do Rato, que as realizou a partir de séries de gravuras que constituíam os retratos de divulgação oficial.
A moderna iconografia régia portuguesa inicia-se com a obra do historiador cisterciense frei Bernardo de Brito, que, na obra Elogios dos Reis de Portugal, justificou a necessidade da inclusão dos verdadeiros retratos dos monarcas portugueses, porque havia, no seu entender, uma íntima relação entre a beleza fisionómica e a beleza interior que emana do carácter virtuoso. A união destas duas belezas seria uma confirmação da razão da permanência da família real no poder por mais de cinco séculos:
Nem me pareceu pouco conveniente ajuntar os retratos à relação de sua descendência, porque sendo a fermosura [exterior] indício da interior, & como tal merecedora de Imperio. Veja o mundo com quanta razão o tiveram [o Império de Portugal], por mais de quinhentos anos sem nunca se passar a coroa a geração estranha.

A história guardou a memória da feiura da rainha Carlota Joaquina, de uma vida devassa com numerosos amantes, uma fama alimentada na sequência da guerra civil e do apoio a D. Miguel. O retrato como princesa do Brasil, com gola de rendas, um colar de pérolas e um complexo penteado, conserva ainda a imagem anterior, o da importância da bela regente para garantir o apoio castelhano perante a ameaça das invasões francesas.
BIBLIOGRAFIA ESSENCIAL
BRITO, Bernardo de. Elogios dos Reis de Portugal com os mais verdadeiros retratos que se puderaõ achar ordenados por Frey Bernardo de Brito. Lisboa: Pedro Crasbeeck, 1603.
MANGUCCI, Celso. Um novo padrão. A Fábrica-Escola de Louça do Rato 1767-1835. Lisboa: Museu de Lisboa, 2017.
