O décimo quarto emblema da obra de Andrea Alciato Consilio et Virtute Chimeram Superari, um dos vários dedicados à prudência, tem como pictura o cavaleiro Belerofonte combatendo o monstro da quimera. Segundo o professor Diego López, responsável pelos comentários da edição seiscentista, o monstro, com a forma mista de leão, cabra e dragão, representava toda uma variedade de vícios. Para vencê-los, o homem sábio deveria pautar-se por uma atitude virtuosa e prudente, personificada pelo herói Belerofonte:

Chimera es una variedad de vicios, y una fuerça de muchas formas, y por esto, quando vemos una cosa confusa dezimos: que Chimera es esta? Bellerofon quiere dezir Varon sabio, entendido, y de buen consejo y dànos à entender Alciato, que para vencer tantos vicios i tantos malos pensamientos, con que el mundo, y el enemigo nos acomete, significados por la Chimera, es menester que seanmos hombres de buen consejo, sabios, y prudentes como Bellerofon.
No painel de azulejos da sala de aula de Metafísica do Colégio do Espírito Santo de Évora, um putto segura uma cartela com o dístico: Chimaeram Insectatur, numa adaptação do dístico do emblema do humanista italiano, que se aproveita da polissemia do verbo insequor (perseguir/caçar) para reforçar a relação com a caçada de Belerofonte representada na pictura.

A Chimaera, o animal mítico que a Prosodia do professor de latim Bento Pereira descreve como um “monstro que fingiam comporse de Leam, cabra, & serpente, & vomitar fogo”, foi aqui, ingenuamente, representada por três animais distintos dissimulados por entre os montes. É provável, por isso, que o pintor de azulejos tenha partido de uma fonte escrita pelo iconógrafo e não de uma gravura.
Entre os diversos painéis de azulejo que compõem a sala de aula e definem o âmbito da investigação metafísica, o filósofo jesuíta tem uma missão fundamental: discernir, dentre as diversas interpretações teológicas, aquela que é a verdadeira. Para ter sucesso nessa empresa, deve aliar os dotes intelectuais aos da prudência, seguindo os conselhos dos homens mais sábios, evitando ambições e o orgulho individual.
BIBLIOGRAFIA ESSENCIAL
MANGUCCI, Celso. História Da Azulejaria Portuguesa: Iconografia e Retórica. Tese de doutoramento. Évora: Universidade de Évora, 2020. https://dspace.uevora.pt/rdpc/handle/10174/28727
MENDEIROS, José Filipe. Os azulejos da Universidade de Évora. Tiles of the University of Evora. Évora: Universidade de Évora, 2002.

