As figuras de convite foram uma maneira de qualificar as escadas nobres e os átrios de palácios e quintas de recreio. Com um efeito ilusório, reconstituem a funcionalidade do espaço arquitetónico no contexto mais geral do edifício.
Nos azulejos do Colégio do Espírito Santo de Évora, as figuras de convite recebem alunos e professores para as aulas e os atos solenes. Na Vila de Azeitão, os guardas, vestidos à francesa, mantêm a ordem no fontanário da pacata vila. Na capela-mor da Igreja do Livramento de Angra do Heroísmo, nos Açores, o padre e o jovem acólito estão sempre disponíveis para o serviço da missa. Desde o primeiro olhar, essas figuras estão associadas ao decoro e à civilidade, representando uma sociedade organizada e polida. São, para todos os efeitos, um complemento do mobiliário e indicam a forma como o ato social se deve realizar.

Apesar de pouco comum, a representação de uma mulher negra a amanhar um peixe na cozinha do Palácio dos Sousa Mexia, atual sede do Museu de Lisboa, segue essa mesma ordem de ideias. De maneira perene, na mesa, com a faca, a escrava raspa as escamas do peixe enquanto um gato tenta a sua sorte. Com sua falta de maneiras, típica dos estratos inferiores da sociedade, a cena sempre incitará alguns risos.
Assim como os criados graves, normalmente cooptados entre a pequena nobreza, povoam as escadas, a escrava saudável, com os dentes à mostra, é um complemento da preparação dos alimentos na cozinha. Foram também um complemento indispensável do estatuto da aristocracia lisboeta que, como se sabe pelas diversas crónicas, faziam-se acompanhar por numerosa criadagem tanto no espaço da casa, como nas deslocações pela cidade.
